Um ano impossível

28 de janeiro de 2010


São Paulo fez 456 anos. São Paulo tem mais de 11 milhões de habitantes. 456 anos têm 166 mil 440 dias. 365 dias de Sampa são equivalentes há 0,22% de tempo de vida da cidade. Eu tenho um ano de vida nessa cidade louca.

0,22 % de história paulistana. Com direito a chuva, muita chuva. E também muito esgoto. Imagine cuidar do saneamento de 11 milhões de pessoas. Impossível, né?

Um ano que mais pareceu um bicho, tentando me engolir entre mais de 30 mil prédios, é concreto para todo lado. Ensurdecedor por tanta poluição sonora, era um bicho faminto, tamanha minha vontade de me conhecer.

Foram 365 dias de descobertas. Descobri, por exemplo, que em São Paulo há um carro para cada 1,8 habitante, quase 6 milhões de veículos circulando na cidade grande. Cruzes! E a qualidade de vida? Impossível. Mas esta é mesmo uma cidade em que o impossível pode acontecer.

De minha parte, achava impossível terminar uma relação construída na amizade e no amor. Impossível gostar de política. Impossível me apaixonar de novo (santa inocência, com mais de cinco milhões de pessoas do sexo masculino, impossível era evitar que um cara me conquistasse). Impossível entender sobre barragens. Impossível gostar de paulistano. Impossível deixar de ser tímida. Impossível querer malhar.

Em São Paulo voltei a gostar de cultura, cinema, dança, samba, futebol. Voltei a gostar de mim. Voltei, principalmente, a gostar do sol. Já disse como chove por aqui?

Minha teia paulistana começou na Vila Guarani, cortou a avenida Paulista, escorregou nas ruas do Itaim, se deparou com o Alto da Lapa, pegou um atalho na Vila Madalena, sambou em Pinheiros, visitou o Vale do Anhangabaú, fez curso na Teodoro Sampaio, encontrou os amigos na Augusta, ficou perdida no Morumbi, caminhou pela Oscar Freire, ouviu jazz em Moema, se apaixonou na Bela Cintra e terminou no Paraíso, com direito a um bom Mocha Branco.

Andei pelas ruas da cidade e conheci seus becos. Tomei péssimos mojitos, que me deixaram tonta. E tonta também fiquei depois de horas e mais horas de trabalho. Alguns dias fui mais paulistana que os paulistanos, meu sobrenome era trabalho.

Aqui sofri injustiça, fui acusada do que não fiz e tive vontade de chorar. E chorei. Chorei a injustiça, a dor de estar sozinha, o nada fazer para ajudar o outro, a saudade dos meus, o vazio da cidade grande. Grande não, enorme. Do tamanho dos meus sonhos e dos sonhos de tantos que vivem por aqui, um lugar cheio de histórias, de fantasmas, de medos.

Uma cidade completa que merece uma homenagem. Daí o texto.

E por mais esforço contra que eu tenha feito (admito que relutei), São Paulo conseguiu me conquistar. Paciência. E parabéns.

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E se fôssemos monstros?

22 de janeiro de 2010




E se houvesse um lugar onde pudéssemos ser selvagens? E se pudéssemos fugir para esse lugar e fazer tudo o que quiséssemos, sem regras ou restrição?

O lugar existe na imaginação de Max (vivido pelo ator Max Records), um menino de 9 anos que se sente solitário e não sabe bem como controlar sua raiva. Os expectadores de “Onde vivem os monstros” (Where the wild things are - 2009) viajam com o garoto para essa terra sem limites.

Em uma noite fatídica, a mãe de Max (interpretada por Catherine Keener) leva o namorado para jantar em casa. É nesse momento que o garoto, em toda sua rebeldia de criança, tenta chamar a atenção da mãe para si. Sem muito sucesso, ele se fantasia de lobo e sobe à mesa da cozinha gritando “Mulher, alimente-me!”. O resultado da estripulia? O castigo de não jantar aquela noite. Max não reage bem à punição, morde a mãe e foge de casa. Ele corre até um matagal e entra em um veleiro mar adentro.

O menino-lobo aporta em uma ilha repleta de monstros. Com fotografia delicada e capacidade de mostrar as relações humanas no dia-a-dia de seres monstruosos, Spike Jonze consegue mais uma vez misturar realidade e ficção sem ser clichê.

Nos filmes “Adaptação” (2003) e “Quero ser John Malkovich” (1999) o diretor trabalhou angústias existenciais típicas de adultos. Com o lobinho Max, ele retrata uma infância cheia de criatividade para lidar com o drama da solidão. O filme é baseado em livro infanto-juvenil homônimo do escritor Maurice Sendak. O roteiro foi escrito por Dave Eggers e pelo próprio Spike.

Os monstros de Jonze são pitorescos - feios e bonitos ao mesmo tempo, todos com personalidades marcantes. Carol é o líder deles e tem uma agressividade aflorada (alter ego do próprio Max). KW é muito dócil e tem vontade de mudar o mundo em que vive. Já Judith é uma monstra rabugenta, vive reclamando mesmo sem motivo.

E se as características humanas dos monstros não forem suficientes para fazer você gostar do filme, afinal "Onde vivem os monstros" foge mesmo do convencional, vale lembrar que a trilha sonora de Karen O, cantora sul coreana, marcada pela mensagem de que tudo é amor (All is Love) impressiona e dá o tom certo de fantasia e solidão de Max.

Mesmo sendo baseado em uma história infantil, o filme tem uma atmosfera muito melancólica, que pode não agradar aos mais jovens. Um enredo envolvente, engraçado, triste, feio e bonito, tudo ao mesmo tempo. É, no mínimo, uma história marcante. Nota máxima para a capacidade de Spike Jonze transformar algo tão fantasioso em um retrato de realidade.

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