Vício moderno
9 de novembro de 2010
Essa vida na cidade grande estressa. Todos os dias preciso falar coisas interessantes no twitter, responder atualizações do facebook e trocar a foto do msn que insiste em voltar para a da semana passada. Orkut? Coisa do início do século, por favor.
Depois checo meus e-mails profissionais, pessoais, empresariais. Dou uma olhada no site de notícias para saber o que acontece no mundo além da minha bolha. Leio uma reportagem bizarra sobre um milionário que desistiu de ser mulher cinco anos depois da operação para mudança de sexo. Imagino a minha avó dizendo: “este mundo está perdido”.
Demandas e mais demandas. Dou mais uma olhadinha no site de notícias. Nossa! Comento com os colegas que teve um terremoto lá em Pasárgada. Imediatamente entro no facebook e pergunto aos meus amigos pasargadenses (que conheci num intercâmbio da faculdade) se eles estão todos bem.
Em minutos respondem que sim, o terremoto aconteceu ao sul de Pasárgada e eles moram ao norte, assim como o rei. Respiro aliviada.
Chega uma corrente na minha caixa de entrada falando que é meu dia de sorte, só preciso fazer um pedido e mandar aquele e-mail para 250 pessoas. Como num passe de mágica meu pedido será atendido. Quando vou deletar, leio: Deus está a espreitar tudo o que você faz. Vai renegá-lo se não passar essa mensagem para 320 amigos.
Fico desesperada. Acho uma sacanagem colocar o nome de Deus nisso. Mas passo a corrente adiante pedindo pelos pasargadenses do sul. Em um texto curto peço desculpa aos amigos e explico que só mando aquela corrente porque sou muito supersticiosa.
Mais umas duzentas mil demandas do trabalho por e-mail e telefone. Chega a hora do almoço. Entro no twitter. O mundo não para. Lá nos trending topics , meninas declaram seu amor na rede mundial de computadores: #retardS2
Gente, o que é retardS2? Estou desatualizada. Percebo que S2 é coração (coitada dessa geração). Retard é a mais nova banda de meninos que se travestem de Teletubbies e fazem o maior sucesso com suas canções do século XXI. Faço uma busca cibernética para descobrir o que eles tocam. Não aguento nem duas notas. Tenho a nítida sensação de que estou velha.
Aliás, a geração Pokémon está velha, eu já sou uma dinossaura. Fico chateada ao constatar. Só me resta criticar. Coloco no meu blog um texto chamando o que eu não conheço de retardado. Puro preconceito.
Mais trabalho. Reunião às 16h. Levo meu smartphone, claro. É preciso estar conectada.
O tempo passa e eu blipo enquanto respondo mais umas 440 demandas internas. Quando vejo, o sol se pôs. Os últimos da sala perguntam se eu quero ganhar o chapéu de funcionária do mês. Em pouco tempo estou sozinha. Viciada no computador. Quando tiver filhos vou ver um dia na internet: O Ministério da Saúde adverte: computador é do mal, vicia e impede a inclusão social.
Penso no tempo que estou perdendo nesse vício. Desligo a torre. Só de pensar no trânsito fora do escritório, entro em parafuso. Do meu celular, aviso aos meus parcos seguidores do twitter: Não peguem o ônibus para a Faria Lima, estou parada há uma hora na Rebouças. #failme
Ufa! A única coisa que quero depois de um dia tão cheio é chegar em casa, entrar no Skype e falar com minha família.